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Acostumados a mandar nos políticos, empresários resolvem ser os próprios políticos


Por Marcelo Pereira

A classe trabalhadora menos politizada de uma certa forma está certa. Ela não quer ver ideologia e sim a satisfação direta de suas necessidades. O enfraquecimento das esquerdas, que oferecem muita teoria e pouca prática, fortaleceu um novo tipo de direita que passa - pelo menos na aparência - longe do neoliberalismo posto em prática pelos direitistas mais tradicionais. O resultado disso é o ódio da política em geral e o desejo de colocar um não-político na gestão pública.

Dois empresários sem experiência política surpreenderam a todos ao vencer eleições. Curiosamente foram eleitos pelas camadas mais pobres das populações. Não que os eleitores se identificassem com eles mas, talvez ingenuamente, acreditassem que eles representassem uma novidade. Além disso, a classe empresarial nunca foi objeto de ódio do senso comum, apesar de errar mais que os políticos.

É impossível não comparar as vitórias de João Dória Júnior para a prefeitura da maior cidade brasileira, São Paulo e de Donald Trump para a presidência dos EUA, o país mais influente do mundo. Curioso que apesar de distantes, o processo que os levou a vitória foi muitíssimo parecido.

A ignorância do fato de que a gestão pública é diferente da privada, somada a ausência de vilania do empresariado, estigmatizado como uma classe altamente responsável e incorruptível (o que não é verdade),  favoreceu o fato desses dois empresários e outros tantos espalhados em cidades menores no Brasil, vencerem as eleições. 

A falsa aura de confiabilidade do empresariado

Empresários passam uma aura confiável, mesmo com patrimônios a níveis estratosféricos. Como vendem produtos e serviços, mesmo cobrando preços abusivos, as pessoas não se sentem traídas pelo empresariado, pois acreditam receber de volta o que pagaram, do contrário das gestões públicas (pagas através de impostos) e a péssima qualidade dos serviços oferecidos por elas.

Claro que essa confiança em Dória e Trump é um faz-de-conta. Com a vitória, eles passaram a ser políticos. Mesmo que seja diferente administrar uma empresa ou uma localidade, empresários e políticos não diferem muito em relação a sede de poder e vontade de usar suas funções para obter muitos lucros financeiros. É ingênuo pensar que o fato deles serem empresários ofereça garantias de honestidade e eficiência. 

No Brasil, os maiores e mais tradicionais políticos também são empresários e fatos comprovam que somente esta condição favorece a sua influência política. Os políticos que não são empresários costumam ficar escondidos, longe do conhecimento público e sem poder de influência.

E nunca podemos esquecer que donos das maiores empresas de qualquer lugar, seja em quaisquer níveis (municipal, estadual, federal), sempre mandaram nos políticos, que nunca devem agir em desacordo com os interesses dos homens de negócio. Os governos de esquerda começaram a incomodar o empresariado e deu no que deu: um golpe político muito bem organizado que tirou as gestões de esquerda para colocar no poder quem pudesse representar o empresariado.

Empresários-políticos como alternativa a políticos-empresários

Ou seja, a eleição de empresários, vendida como novidade, pode ser na verdade o mais do mesmo. E transformados em políticos, sendo empresários, acabam se unindo aos políticos que são empresários, mesmo oferecendo um discurso que os apresente como diferentes, propondo a resolver com certo imediatismo os problemas da população mais carente, que desconhece como funciona as redes do poder.

No final, toda e qualquer forma de liderança acabará agindo de forma igual, pois não importa qual classe de liderança originária, a ganância sempre será a sua principal característica. Enquanto a ganância for o traço das maiores lideranças mundiais, podem estar certos de que nada mudará no planeta. 

Cronicamente gananciosos, nossos líderes sempre serão os mesmos, fazendo as mesmas coisas que souberam fazer: usar o poder para enriquecer e obter influência. mantendo as populações mais carente aprisionada na eterna função de figurantes abandonados.

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